Keblinger

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Flores do Sertão @simonebrichta

| terça-feira, 15 de janeiro de 2013


Flores do Sertão

Respondeu que não. Que não sabe ler
e tão pouco escrever.

Nunca viu o mar? Não senhora,
 mas dizem que é açude grandão, sem paredes.

Sou sertanejo, não conheci escola
 só vejo o céu, sei ler estrelas nas luas cheias do sertão.

Os meus filhos fazem letras no papel,
 nem sei desenhar meu nome, mas toco repente e sei rimar.

Na escola, meus miúdos vão pra aprender a fazer conta.
Só se vive se sabe cobrar e pagar, dona. A vida aqui é peleja.

Minha idade, eu não tenho certeza,
sou homem maduro, tronco de terra firme.

Aquele retrato – não conheço,
mas gosto do sorriso. Viu o do finado, o anjinho, na parede?

Na cidade vejo o doutor, não me atrevo a puxar prosa,
sou modesto, venho atrás do remédio. Bom mesmo é xarope de raiz.

Quando o mal me acomete, chamo Maria Caipora.
É a benzedeira mais afamada do Vale.

Agora é meio-dia, fia.
 Sol a pino, boca seca e barriga vazia, hora da boia quente.

Volto pra lida, debaixo da fervura, tenho bocas,
meninos pequenos, são sete os meus.

Já é hora. Vou levar o cachorro outra vez,
 ontem mesmo, Fulô matou uma cobra.

E acredite, a mulher levou pra panela,
o cozido que é um manjar.

Segue o astro, com enxada no ombro,
em peito nu de pele fadigada.

E as rachaduras dos calcanhares,
marcam o chão de poeira na estrada.

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